Direito Tributário -
A Controvérsia Tributária do IPI Não Recuperável na Base de Cálculo dos Créditos de PIS e COFINS: Análise da Ilegalidade da Instrução Normativa RFB nº 2.121/2022
A sistemática da não-cumulatividade do PIS e da COFINS foi estabelecida no plano infraconstitucional pelas Leis nº 10.637/02 e nº 10.833/03, em conformidade com o Art. 195, §12º, da Constituição Federal.
A controvérsia surge especificamente sobre se o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) não recuperável, incidente na operação de compra de mercadoria, deve integrar a base de cálculo desses créditos. Historicamente, o IPI não recuperável, por compor o custo de aquisição, era considerado para fins de creditamento de PIS e COFINS. Esse entendimento estava inclusive regulamentado na Instrução Normativa nº 1.911/2019, em seu Artigo 167, inciso II.
Contudo, a superveniência da Instrução Normativa nº 2.121, editada em 15 de dezembro de 2022, revogou a norma anterior e afastou o aproveitamento do crédito sobre o IPI destacado nas notas de aquisição, de maneira considerada inconstitucional e ilegal.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) afetou o Tema nº 1.373 para definir se "o IPI não recuperável incidente sobre a operação de compra de mercadoria para revenda integra a base de cálculo dos créditos da contribuição ao PIS/Pasep e da Cofins".
O direito ao crédito de PIS e COFINS aplica-se aos bens adquiridos para revenda e aos custos e despesas incorridos. O elemento chave para o creditamento é o conceito de custo de aquisição.
O IPI é classificado como "não recuperável" quando a pessoa jurídica adquire a mercadoria, mas não pode tomar créditos relativos ao IPI pago na operação de entrada para descontá-lo na operação de saída, tornando-se, assim, um custo efetivo enfrentado pelo adquirente.
Diversas normas corroboram o entendimento de que o tributo não recuperável integra o custo de aquisição:
1. Norma Contábil: O Comitê de Pronunciamento Contábeis (CPC) nº 16, em seu item 11, estabelece que o custo de aquisição dos estoques compreende o preço de compra e outros tributos (exceto os recuperáveis junto ao fisco).
2. Legislação Infraconstitucional: O Decreto nº 9.580/2018 (RIR), no Art. 301, §3º, dispõe que "os impostos recuperáveis por meio de créditos na escrita fiscal não integram o custo de aquisição". Por lógica, se o imposto não é recuperável, ele integra o custo.
3. Posicionamento Anterior da RFB: A própria Receita Federal do Brasil (RFB), por meio da Solução de Consulta COSIT nº 579, de 2017, já havia se posicionado no sentido de que o IPI, quando não recuperável, integrava o custo de aquisição dos bens destinados à revenda e, por direito, era utilizado como base para apuração dos créditos de PIS e COFINS.
As Leis nº 10.637/02 e nº 10.833/03 asseguram o desconto de créditos sobre bens adquiridos para revenda e custos incorridos.
A Instrução Normativa nº 1.911/2019, em seu Artigo 167, inciso II, permitia o creditamento de PIS e COFINS sobre o IPI incidente na aquisição, "quando não recuperável".
A IN RFB nº 2.121/2022, ao ser editada, revogou a norma anterior e estabeleceu, em seu Artigo 170, inciso II, que não geram direito a crédito as parcelas do valor de aquisição não sujeitas ao pagamento das contribuições, listando especificamente "o IPI incidente na venda do bem pelo fornecedor".
Essa alteração normativa infralegal é questionada por violar o princípio da legalidade e o Artigo 110 do Código Tributário Nacional (CTN).
O princípio da legalidade tributária (Art. 150, I, da CF e Art. 97 do CTN) estabelece que somente a lei em sentido formal pode exigir ou aumentar tributo.
Uma Instrução Normativa não possui a função de inovar no ordenamento jurídico, mas apenas de regulamentar a legislação existente.
Ao excluir o IPI não recuperável do custo de aquisição elegível para crédito, a IN nº 2.121/2022, sem alteração legislativa prévia (Leis nº 10.637/02 e 10.833/03), promoveu uma restrição de direitos do contribuinte e uma inovação jurídica.
Essa restrição acarreta uma majoração indireta da carga tributária. Ao glosar (excluir) uma parcela legítima do custo (o IPI não recuperável), o crédito do contribuinte é artificialmente diminuído, elevando por via reflexa o montante líquido devido a título de PIS e COFINS. Qualquer aumento de ônus fiscal, mesmo indireto, requer lei em sentido formal.
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), em decisões sobre o tema, tem reconhecido que o IPI não recuperável compõe o custo de aquisição para fins de creditamento de PIS e COFINS, em razão da não-cumulatividade e da ausência de previsão legal para a restrição administrativa.
O Judiciário tem se manifestado no sentido de que a IN nº 2.121/2022 padece de ilegalidade por restringir direitos em manifesta violação ao Artigo 13 do Decreto-Lei n.º 1.598/1977 e aos Artigos 3º das Leis n.ºs 10.637/2002 e 10.833/2003.
CONCLUSÃO
A Instrução Normativa RFB nº 2.121/2022, ao vedar o creditamento de PIS e COFINS sobre o IPI não recuperável, violou o princípio da não-cumulatividade, previsto constitucionalmente (Art. 195, §12º da CF), e o princípio da legalidade (Art. 150, I, da CF e Art. 97 do CTN).
O direito de creditamento está respaldado na legislação federal (Leis nº 10.637/02 e nº 10.833/03) e nos conceitos jurídico-contábeis que definem o IPI não recuperável como custo de aquisição.
A restrição imposta por meio de ato infralegal (Instrução Normativa) extrapola o poder regulamentar, resultando em majoração indireta de tributo.
Enquanto o Tema nº 1.373 aguarda julgamento definitivo pelo STJ, a posição majoritária tem reconhecido o direito de o contribuinte incluir o IPI não recuperável no custo de aquisição para fins de creditamento de PIS e COFINS



